Ouvindo a música “Kiss” do Prince e lendo uma noticia da ex-boa-moça-tímida-e-comportada Marjorie Estiano não pude deixar de lembrar este texto abaixo que escrevi alguns anos atrás. Impossível não encaixar ela neste texto, seja na destruidora de corações: a mocinha comportadinha e sexy das novelas (feia bonita), ou seja na trabalhadora do final do texto: a personagem vivida no teatro e no ensaio para revista Trip, ou vice-versa.
“Estava sentado já havia tempo, no seu quarto, no escuro. O corpo largado sobre uma poltrona velha, com o couro já rasgado. Olhava pela janela aberta o céu escuro e sem estrelas. O vento entrava, mas não causava-lhe desconforto algum. Não era o vento que estava lhe causando aquele mal estar. Ouviu várias músicas naquela noite, mas a última já havia escutado mais de dez vezes. O CD no repeat, um som envolvente e um refrão que fica na cabeça “I just want your extra time and your....... kiss”. A imagem dela, com pouca roupa – bem pouca mesmo – dançando aquela música, o cheiro do cabelo molhado, o brilho dos olhos, hormônios, lembranças.Mas não terminaria aquela noite sozinho. Tomou o último gole do whisky, apagou o cigarro. Pegou o seu casaco impermeável e quente, que ainda estava sobre a cama, que não fora desfeita. Saiu sem ao menos desligar o rádio, trancou a porta com duas voltas da chave e começou a caminhada em silêncio. Esquinas após esquinas. As goticulas de chuva que caiam estavam geladas, assim como o vento, mas sabia: não terminaria mais uma noite sozinho. Com todo aquele frio tudo estava fechado, não havia lugar algum aberto, para uma boa conversa e uma dose de alguma bebida quente. Mesmo assim caminhava, pensamentos em lembranças: de beijos, abraços, gargalhadas, de pele. Mas não terminaria mais uma noite sozinho, disto já tinha se decidido. Caminhou sem rumo, seguindo o instinto, o faro. Já estava encharcado e tremia, era uma noite fria de junho, mas seus pensamentos continuavam naquele balanço, naquela música, naquele corpo quente, cheio de movimentos, tão antagônico àquela noite. Mas esta noite não terminaria com ele sozinho. Dobrava esquinas aqui, atravessa praças ali, lugares onde nunca tinha passado, lugares familiares, lugares escuros, outros claros. Andou muito naquela noite, mas sempre os pensamentos eram lembranças: telefonemas nas madrugadas, camas desarrumadas, o cheiro de sexo, o riso de satisfação. E esta noite, com certeza, não terminaria sozinho. Aquele mal estar deveria passar, assim que os pensamentos passassem. Mas não passavam, continuavam, assim como a música que ouvira antes, como se tivesse uma tecla repeat na sua cabeça. Parou em frente a um motel barato, não demorou apareceu um vulto feminino e uma voz “Quer esquentar esta noite fria?”. Enfiou a mão no bolso e sentiu o bolo de notas. Infelizmente, não terminaria aquela noite sozinho.”
Reconheceram a ex-boa-moça-tímida-e-comportada?!?
quarta-feira, dezembro 22, 2010
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Um comentário:
quase nenhuma moça é tímida e comportada em tempo integral
belo texto
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